Antonio Carlos Guimarães: Biografia romanceada Abigail – Mediunidade e Redenção
Trecho do livro “Abigail – Mediunidade e Redenção”
1 – Uma cidadezinha ao pé da serra
Ele me faz repousar em pastos verdejantes.
Leva-me para junto das águas de descanso.
(SALMOS, cap. 23, v. 2).
A cidadezinha de Águas Virtuosas é vista como a mais bonita da região das estâncias hidrominerais do Sul de Minas. Situada no centro de um vale suntuoso, em forma de concha, é resguardada ao norte das fortes correntes de ar pela imponente e majestosa Serra das Águas, que se alteia a mais de mil e duzentos metros. Ao sopé da montanha, através do rio Mumbuca, que nessa serra tem sua cabeceira, águas cristalinas serpeiam e rolam ligeiras, borbulhando nas pequenas quedas e nos trechos mais sinuosos.
No centro da várzea em que manam as águas avigorantes, um casario modesto mas bem ordenado se distribui por ruas e avenidas largas e bem traçadas, que revelam adequado planejamento urbano. Ao derredor, como a emoldurar o vale, erguem-se colinas e montes. Uma longa encosta, denominada Sertãozinho, abriga em seu topo o cruzeiro; um outeiro mais sóbrio, a matriz de Nossa Senhora da Saúde. Ao sul avista-se o pico do Morro do Selado, a sudoeste a Serra de Santa Catarina, a nordeste as montanhas de Conceição do Rio Verde, próxima da qual se cortou o Caminho Velho da Estrada Real.Nuanças de verde pintam esse belo quadro montanhês: verdivivo nos morros mais próximos e tons verde-azulados que aos poucos se acinzentam nos montes mais ao fundo. De qualquer dos pontos elevados mais próximos, pode-se mirar obras do engenheiro Américo Werneck — o prédio do cassino, o lago, o farol, a cascata, o parque novo —, que acentuaram à cidadezinha o seu ar de estância européia e a prepararam para vir a ser um grande centro de turismo. E assim também se avista a linha férrea, que corre ao entorno, e liga a aprazível vila aos principais centros urbanos do país.
A esse sítio montanhoso tão extraordinário, permanentemente exposto ao sol, a Natureza dotou ainda de vária vegetação e de clima suave, bem dosado entre o quente e o frio, no qual se goza de ar puríssimo e de atmosfera vivificante. São essas fontes de águas medicamentosas e o cenário encantador, tão nutritivos ao espírito quanto ao corpo, que atraem milhares de turistas nas estações de veraneio à busca de repouso, tranquilidade e saúde.
Corria o ano de 1925, quando um jovem alto, forte, desempenado, tez amorenada de quem lida ao sol, desceu a Serra das Águas ao trote seguro e macio de uma vistosa mula ruana, cuja toada seguia livre, que o cavaleiro deixara soltas as rédeas, com o pensamento vagando longe e a ponta de um sorriso a vincar-lhe o canto dos lábios. Retornava ele da Ressaca, distrito de São Gonçalo do Sapucaí, onde fora pedir a mão de Margarida Augusta Fernandes, moça pequena e formosa que lhe tomara, de um só golpe, o coração e a alma, há dois meses passados. O sorriso que ensaiava nascer tinha como origem a cena do primeiro encontro.
Numa visita inesperada ao sítio em que morava, Margarida e sua mãe Francisca Finalda surpreenderam-no a espojar-se pelo chão da sala, brincando com Guiomar e outros sobrinhos, que entre gritarias haviam-lhe enfeitado os cabelos negros e fartos, penteados para trás, com flores campestres, e se divertiam com as momices daquele tio de mais de vinte anos a comportar-se como um menino. Recordava-se bem do rubor que lhe cobrira o rosto e do desacocho que passou para cumprimentar as recém-chegadas. Agora fazia planos de ter com Margarida uma casinha repleta de alegria das suas próprias crianças.
Ao aproximar-se do pé da serra, o sol esbatia os últimos traços da leve bruma que a madrugada úmida trouxera. Mal entra na rua principal, e Guaraciaba, toda ajaezada, sela de couro trabalhado e laço de oito braças, já chama a atenção. Quanto quer pela mula, moço? Esta não tem preço. Vai morrer comigo, vai respondendo a quantos perguntam, com sua fala fácil e cadenciada, entremeada com risadas fartas e sonoras. E o jovem, a quem chamavam por José Batista, mas que fora registrado por José Guimarães Silva, ruma em direitura à gleba situada ao sopé do Morro do Selado. Vai narrar aos familiares as novidades do casamento.
Autor: Antônio Carlos Guimarães
Enviado por: Antônio Carlos Guimarães
Belo Horizonte/MG
O texto acima integra a obra “Abigail – Mediunidade e redenção”, publicada em 2009, pela editora Casa Espírita Francisco de Paula Vítor. O autor Antônio Carlos Guimarães, Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil, escreveu o livro sob o pseudônimo de Antônio Lobo Guimarães. Nascido em Lambari/MG, ressalta em seus livros, além das histórias dos personagens-título, as belezas e peculiaridades do Estado de Minas Gerais. Antônio também escreveu “Menino-Serelepe – um antigo menino levado contando vantagem”, que narra as peripécias da infância do autor, nas décadas de 1950 e 1960.
Em “Abigail – Mediunidade e Redenção”, biografia romanceada, o colega conta a história de uma jovem que viveu em Lambari/MG em luta pela redenção espiritual. O livro apresenta ainda notas geográficas, históricas, biográficas e memória do Centro Espírita Vinte e Quatro de Junho, atual Casa Espírita Francisco de Paula Vítor, local em que Abigail obteve a cura.